sábado, 27 de junho de 2015

O Estatuto da Pessoa com Deficiência - Polêmicas.

Fábio Adiron, do Xiita da Inclusão, posicionou-se no Yahoo Grupos contra o Estatuto e tece uma argumentação que vale a pena conhecer:

Pessoal

Algumas pessoas me questionaram o por que sou contra o Estatuto. Vou reproduzir abaixo os textos que já escrevei e/ou apoiei a esse respeito. Os que tiverem paciência de ler terão todas as respostas

Claro que existe muita gente interessada no modelo assistencial renovado com vestimenta inclusiva que permeia o texto. Especiamente aqueles que se beneficiam economicamente tutelando as pessoas com deficiência.

Além da disputa de quem vai conseguir dar nome à nova lei...vanitas vanitatis...

Abraço

Fábio Adiron


Manifesto Contra o Estatuto da Pessoa com Deficiência. (Texto do CVI Araci Nallin, que eu apoiei)
No projeto de lei que prevê a criação do Estatuto da Pessoa com Deficiência estão inseridos programas, serviços, atividades e benefícios, muitos deles ainda concebidos através de uma visão assistencialista e paternalista e por vezes até autoritária em relação às pessoas com deficiência.
Isto porque muitos ainda nos veem como objeto de caridade, como incapazes e sem direito de fazer nossas próprias escolhas, tomar decisões e assumir o controle de nossas vidas.
Este projeto de lei, resultado de consultas públicas ao longo de alguns anos, como dizem seus defensores, altera a legislação vigente nos eixos da educação, saúde, trabalho, transportes e outros, enfim, altera as leis que hoje cunham as políticas públicas em todas as esferas de governo: federal, estadual, municipal e distrital.
Sabemos que vários interesses conflitantes permeiam cada um dos temas tratados no Estatuto. São interesses políticos, econômicos e corporativos que não representam as atuais conquistas do movimento das pessoas com deficiência.
Dizer que o Estatuto é inevitável e por isso temos que colaborar para que o seu texto seja menos ruim, é negar anos de luta do Movimento das Pessoas com Deficiência que desde 1981 - Ano Internacional das Pessoas Deficientes - começou a exigir "participação plena e igualdade de oportunidades". De lá para cá muitas ações reforçaram esta exigência. Nosso Movimento foi autor de alguns artigos da Constituição Federal de 1988 e conseguiu aprovar e barrar inúmeras leis.
O Estatuto é uma volta ao passado, quando os instrumentos legais e recomendações internacionais eram direcionados ao assistencialismo às pessoas com deficiência.
Nos tempos atuais um estatuto específico para nós é um contra-senso e um retrocesso, se coloca na contramão da evolução histórica, prejudicial ao reforçar a imagem de inválido e "coitadinho", levando a sociedade a continuar tratando a pessoa com deficiência como um ser desprovido de capacidade. Desta forma, o Estatuto legitima a incapacidade e oficializa a discriminação contra a pessoa com deficiência ao separá-la das leis comuns.
O Estatuto é desnecessário, pois a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, maior conquista da história mundial dos direitos humanos, já faz parte do nosso arcabouço legal, ratificada através do Decreto Legislativo 186/2008, com status de emenda constitucional, e reafirmada pelo Decreto 6946/2009.
Basta agora ajustar nossa legislação à ela. Já existe um estudo, encomendado pela CORDE e patrocinado pela UNESCO, que faz um paralelo entre a Convenção e a Legislação existente e aponta as alterações necessárias.
Nossa luta urgente é pela criminalização da conduta discriminatória contra as pessoas com deficiência.
Estamos caminhando para que a sociedade perceba que a pessoa com deficiência faz parte da população e é titular de todos os direitos, obrigações e liberdades fundamentais. Deverá ficar claro que, nas leis comuns, a pessoa com deficiência está incluída com o mesmo direito aos serviços oferecidos à população e que serão previstas especificidades de usufruto somente quando as condições de uma determinada deficiência assim exigir.
Em tal contexto, não haverá lugar para um Estatuto separado sobre as pessoas com deficiência. Todas as eventuais vantagens de um instrumento como este não compensam a anulação do processo de amadurecimento, evolução e conquistas do movimento das pessoas com deficiência nos últimos 30 anos, no Brasil.

Porque sou contra o Estatuto (texto meu de 2009)
"Triste não é mudar de idéias... Triste é não ter idéias para mudar!" Barão de Itararé


Ressurgiu essa semana a discussão sobre a necessidade ou não de um estatuto especial para as pessoas com deficiência. O motivo é um projeto de lei (na verdade vários projetos que foram apensados) com essa proposta. O projeto que está em discussão é um lixo. Quanto a isso há consenso geral em todo o movimento em defesa das pessoas com deficiência. Ele apenas serve aos interesses daqueles que vivem da exclusão e da segregação. Por isso, nem vou entrar no mérito do mesmo.

Acredito que a discussão de fato é, mesmo que o projeto fosse bom, seria necessário um estatuto? (seria necessário qualquer estatuto?)

Do ponto de vista legal, temos uma infinidade de leis específicas para pessoas com deficiência. Algumas boas, muitas ruins ou antiquadas. Algumas garantidoras de direitos, outras apenas concessão de privilégios. O problema não é a falta de leis, mas a falta do cumprimento delas. Temos muitas leis que nunca foram regulamentadas. Outras tantas que, apesar de regulamentadas, não são fiscalizadas. Pior, uma grande parte das leis não tem mecanismos de punição para quem as descumpre, o que as torna completamente inóquas.

No ano passado conseguimos a ratificação da Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência, com status de norma constitucional. Certamente é uma convenção discriminatória (lembrando que discriminar significa "fazer distinção") pois assume a existência de uma categoria diferente de seres humanos que não estariam cobertos pela declaração universal do direitos humanos. Mesmo assim foi um grande passo para uma população que, antes, não só não era considerada humana, como também não tinha acesso a direitos.

Nesse contexto a convenção passa a ser a diretriz para qualquer lei que venha a ser criada e para a revisão das leis que a contrariem.

Os defensores do estatuto entendem que existe a necessidade de se fazer uma consolidação das leis a respeito das pessoas com deficiência, e o estatuto seria o instrumento para isso. Durante um tempo eu também acreditei nisso.

Um estatuto é uma lei orgânica ou regulamento especial por que se rege um Estado, corporação, associação, companhia, etc. Ele serve para regular questões essenciais, questões referentes a comportamentos, atitudes das pessoas dentro de uma sociedade comum.Oras, se a sociedade é comum a todos, para que uma lei que proteja especialmente alguns? Ah, dirão alguns, porque são grupos historicamente discriminados, porque são cidadãos em estado de maior fragilidade.

Nesse caso não seria o suficiente aplicar a lei que serve para todos? Os direitos de todos não são válidos para as crianças, para os idosos, para qualquer cor ou etnia? Não serão bons inclusive para as pessoas com deficiência? Uma sociedade que não precise ser dividida em castas não é o nosso sonho de sociedade inclusiva?

Como o próprio Estado não cumpre as leis que tem, passa a inventar novas leis (que também não são cumpridas). Isso não passa de estratégia caça-votos (claro, se não fosse, porque então os legisladores se pegam de tapas para ter seu nome na lei?) ou estratégia diversionista - enquanto a gente fica anos discutindo a lei, ganha-se tempo para não cumprir as que existem.

Pergunta-se então: a quem serve uma sociedade que o estatuto quer edificar? Um país dividido em “castas” promoveria justiça para todos os excluídos das oportunidades econômicas, políticas, sociais e culturais? Seria a promoção da “casta” o melhor remédio contra a discriminação?

O que a sociedade precisa não é de mais leis, mas de criar e reforçar os instrumentos de controle para que as leis sejam de fato cumpridas. Isso está longe de acontecer. Numa sociedade em que cada um está preocupado só com o seu quintal não vai acontecer nunca.

Controle social dá trabalho, exige comprometimento, visão comunitária e isenta de preconceitos. Impossível numa sociedade em que todo mundo pratica alguns tipo de discriminação social.

É mais cômodo se deixar envolver pelas nuvens de fumaça.

Abaixo-assinado Pelo Arquivamento do Projeto de Lei que Institui o Estatuto da Pessoa com Deficiência.(Texto do Bengala Legal que subscrevi em 2011)

Para: Congresso Nacional

A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência é o instrumento facilitador para o exercício e gozo dos direitos reconhecidos no sistema universal, para que elas os vivam, plenamente, e em igualdade com as demais pessoas.

A deficiência é um produto social, fruto da relação das pessoas com deficiência com seu entorno. O ambiente, assim, pode ser capacitante ou incapacitante.

No projeto de lei que prevê a criação de um Estatuto da Pessoa com Deficiência estão inseridos programas, serviços, atividades e benefícios, muitos deles ainda concebidos através de uma visão assistencialista e paternalista e por vezes até autoritária em relação às pessoas com deficiência.

Este projeto de lei, resultado de várias consultas públicas ao longo de alguns anos, como dizem seus defensores, ainda mantém em grande parte esta atitude tuteladora, vendo as pessoas com deficiência como não fossem capazes e com direito de fazer suas próprias escolhas, de tomar suas próprias decisões e de assumir o controle de suas vidas.

Retira a responsabilidade prioritária do Estado de assegurar a efetivação dos direitos humanos e fundamentais das pessoas com deficiência, quando compartilha esta responsabilidade com a família, com a comunidade e a sociedade.

Faculta ao Estado fazer convênios e parcerias com Instituições, Fundações e Organizações no que toca a saúde, educação e trabalho, não criando nenhum mecanismo de controle destas Instituições, em detrimento a qualidade dos serviços prestados.

Não avança para garantir um ensino de qualidade para todos e nem emprego digno às pessoas com deficiência, pelo contrário legaliza novamente a exploração da mão de obra deste segmento, permitindo o enriquecimento desmedido do que chamam de entidades qualificadas para intermediar.

Apesar de estar escrito que esta lei, caso aprovada, entraria em vigor decorridos 90 dias da sua publicação, ela não é auto-aplicativa, e necessita de várias normalizações para poder entrar em prática.

É oportuno relembrar que a proposta do Estatuto da Pessoa com Deficiência nasceu fora da nossa representatividade.

O nome inicial do projeto de lei – que era Estatuto do Portador de Necessidades Especiais – já é sintomático de que foi dado por pessoas que não nos representam.

Acima disto, reflete uma atitude de proteção assistida e de separação.

Ele é uma volta ao passado quando havia a necessidade de um instrumento com estas características para dar assistência à generalização da situação precária das pessoas com deficiência, mas sem abrir mão da incapacidade das pessoas com deficiência de conviver e competir com a sociedade geral.

Nos tempos atuais um estatuto específico para nós é um contra-senso e um retrocesso, se coloca na contramão da história.

O Estatuto é prejudicial no sentido de reforçar a imagem de inválido e coitadinho, levando a sociedade a continuar tratando a pessoa com deficiência como um ser desprovido de capacidade para cuidar de si.

Neste sentido, para a sociedade em geral o Estatuto da Pessoa com Deficiência se torna a comprovação desta suposta incapacidade e constitui uma espécie de oficialização da discriminação contra a pessoa com deficiência, ao separar esta pessoa das leis comuns.

Desde 1981, Ano Internacional das Pessoas Deficientes, começamos a exigir “participação plena e igualdade” de oportunidades dentro da sociedade e não fora dela.

De lá para cá muitas ações reforçaram esta exigência.

O movimento foi autor de alguns artigos da Constituição Federal de 1988 e conseguiu aprovar inúmeras leis até hoje.

A Convenção incorporada de fato à legislação brasileira, ela não apenas obrigará que as leis vigentes sejam revisadas e atualizadas, mas servirá de parâmetro para que as leis futuras venham a incluir a questão da deficiência entre seus artigos, diminuindo gradativamente a necessidade de leis específicas para as pessoas com deficiência, separadas das leis comuns.

A partir da Convenção todas as questões relativas às pessoas com deficiência deverão ser inseridas em leis comuns, que passarão a ser conhecidas como leis inclusivas, levando a sociedade a perceber que a pessoa com deficiência faz parte da população e é titular de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais.

Deverá ficar claro que, nessas leis comuns, a pessoa com deficiência está incluída como titular de direito aos mesmos serviços oferecidos à população e que serão previstas especificidades de usufruto desses serviços somente quando às condições de uma determinada deficiência assim a exigirem.

Em tal contexto, não haverá lugar para um estatuto separado sobre as pessoas com deficiência.

Todas as eventuais vantagens de um estatuto da pessoa com deficiência não compensam a anulação do processo de amadurecimento, evolução e conquistas, desenvolvido pelo movimento das pessoas com deficiência nos últimos 30 anos, no Brasil e no mundo.

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